segunda-feira, 26 de abril de 2021

Ex-aluna da rede pública estuda com vídeos gratuitos e é aprovada em 1º nas cotas para enfermagem da UFF: ‘Livro é muito caro’.


Aos 18 anos, Ana Liris Conrado já tinha a agenda cheia: fazia ciências biológicas na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj); dava aula de reforço a crianças, para ajudar em casa; e estudava sozinha, sonhando com a possibilidade de mudar de área e cursar enfermagem.

“Livro é muito caro, não dá, né? Os que eu tinha, devolvi na escola”, conta. A solução que 
encontrou foi assistir a lives em redes sociais e a vídeos gratuitos sobre os conteúdos 
cobrados no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

E deu certo: ela foi aprovada em 1º lugar na Universidade Federal Fluminense (UFF), na 
modalidade de cotas para ex-alunos da rede pública com renda familiar inferior a 1,5 salário 
mínimo por pessoa (R$ 1.650).

“Consegui aumentar bastante a nota que eu tinha tirado no ano anterior. Na redação, 
saltei de 880 para 960 pontos”, conta. “Eu até tentei criar uma rotina mais tradicional, 
mas odeio estar trancada sozinha. Ficava deitada no quarto dos meus pais, com a 
minha irmã mais nova, vendo os vídeos e estudando.”

Ana Liris sabia que não seria fácil passar na UFF. Por mais que sempre tivesse se dedicado 
aos estudos, teve de mudar de uma escola particular para uma pública no 9º ano do ensino 
fundamental, porque seus pais não conseguiam mais pagar as mensalidades.

“Foi uma diferença muito grande, porque tinha greve de professor, falta de material, 
desorganização”, diz. “No último ano, fiz um pré-vestibular gratuito, mas aí parei e foquei 
nos estudos em casa mesmo.”

Em 2020, ela foi aprovada na Uerj e começou a cursar ciências biológicas. Mas, desde o 
início do ano letivo, decidiu que continuaria estudando para o Enem, já que seu objetivo era 
entrar em enfermagem em uma universidade pública.

Dificuldades financeiras

A situação financeira da família não é confortável: o pai da jovem, aos 52 anos, está 
desempregado desde antes da pandemia. A mãe dela, enfermeira, sustenta a casa com o 
salário de auxiliar de enfermagem na prefeitura de São Gonçalo (RJ).

Ana Liris recebia o auxílio estudantil como aluna da Uerj (quantia dada a alunos de baixa 
renda para ajudar no pagamento de alimentação e transporte). E, para contribuir em casa, 
dava aulas particulares de todas as disciplinas para crianças do ensino fundamental. “Como, 
na Uerj, eu fazia licenciatura em biologia, estava aprendendo muito sobre educação”, diz.

O tempo dela, portanto, era dividido entre as atividades on-line da faculdade, o trabalho como 
professora e a rotina de estudos para o Enem. Seria difícil concorrer com alunos que estavam
se dedicando integralmente ao preparo para a prova.

“Por isso que as cotas são tão importantes. Se você for ver as notas do pessoal da ampla 
concorrência, são muito altas. Eles estudaram em escola particular e tiveram condições de 
pagar um [cursinho] pré-vestibular bom”, afirma.

“Sem cotas, seria muito difícil para a gente, de escola pública, conseguir uma vaga.”
Agora, aprovada em enfermagem na UFF, ela precisará cancelar sua matrícula na Uerj, já que 
a legislação brasileira não permite que o mesmo aluno estude em mais de uma instituição 
pública ao mesmo tempo.

Mãe como inspiração



Desde pequena, Ana Liris sonha em seguir a mesma profissão da mãe. “Ela sempre trabalhou 
em posto de saúde, e eu amava vê-la dando vacina nos bebês; era muito divertido para mim”, 
diz. “No começo, eu queria ser obstetra. Agora, neonatologista [especialista em recém-nascidos].”

As futuras colegas de trabalho já conversam sobre enfermagem. “Ela ficou muito feliz com o 
meu resultado, mas também me diz que não será fácil. É uma área desfavorecida. Na 
pandemia, a gente vê que todo mundo precisa dos enfermeiros nos hospitais públicos e nos 
postos de saúde, mas, ainda assim, as condições de trabalho e os salários são complicados.”

Ana Liris sabe das dificuldades, mas está animada para o início das aulas da UFF, em junho.

“Nem acredito que deu certo. Eu achava que precisaria ficar em outro curso mesmo, porque a 
nota [de corte] de enfermagem era alta. Mas sempre que eu falava em desistir, minha mãe 
ficava quieta ou dizia: ‘Calma, vai dar certo’."

Fonte: G1

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