sábado, 22 de junho de 2019

Brasil lidera índice de violência contra professores. O que podemos fazer?

Os casos de violência contra professores dentro das escolas seguem cada vez mais frequentes no país e apontam para as consequências na saúde física e emocional de profissionais da Educação

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Crédito: Getty Images
Somente na última semana, a imprensa e as redes sociais noticiaram diversos casos de agressões físicas contra professores brasileiros. Em uma das ocorrências, sete alunos em uma escola estadual em Carapicuíba arremessaram livros e carteiras em uma professora. Em outro, a mãe de um aluno agrediu fisicamente uma professora na saída da escola.
De acordo com dados de uma pesquisa feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre violência em escolas com mais de 100 mil professores, o Brasil lidera o ranking de agressões contra docentes. Dentre os professores ouvidos, 12,5% afirmaram ser vítimas de agressões verbais ou intimidações de alunos. Em São Paulo, segundo levantamento feito pela GloboNews, o número de agressões a professores cresceu 73% em 2018 em relação ao ano anterior. Já dados divulgados sobre uma pesquisa feita pelo Sindicato dos Professores de São Paulo apontam que mais da metade dos docentes da rede estadual de ensino afirmam já ter sofrido algum tipo de agressão, sendo a mais comum a agressão verbal (44%), seguida por discriminação (9%), bullying (8%), furto/roubo (6%), e agressão física (5%). 
A violência no ambiente escolar ocorre de diversas formas, seja pelo bullying ou por manifestações mais extremas como na tragédia da Raul Brasil, em Suzano. A violência contra professores é mais uma forma de violência que, infelizmente, parece normalizada pela falta de debate ou de propostas práticas para lidar com o problema.
Quando nos deparamos com qualquer tipo de manifestação de violência na escola, surge a pergunta: mas, afinal, de quem é a culpaDa família ou da escola? É complexo responder a perguntas como essas justamente por não haver uma única resposta. A educação de um indivíduo se dá principalmente de três formas: pela família, responsável pela socialização primária, pela escola, local onde a criança passa a conhecer a vida coletiva, e pela sociedade, com suas múltiplas influências culturais e sociais. Portanto, não se trata de responsabilizar uma ou outra, mas sim de reconhecer os diferentes papéis de cada uma e atuar em parceria para que de forma intencional tenhamos como base o convívio social pacífico, o respeito, o olhar atento para manifestações preocupantes relacionadas à saúde mental, o aprendizado sobre como resolver os nossos conflitos, e a capacidade de reconhecer as nossas emoções para que saibamos reagir a elas sem violência verbal ou física. Além disso, o poder público deve oferecer propostas e subsídio financeiro para o desenvolvimento de projetos voltados à cultura de paz nas escolas e apoiar o diagnóstico sobre a cultura escolar em diferentes insituições para que, assim, medidas preventivas possam ser adotadas. 

Impactos na saúde física e emocional

As consequências da violência contra professoras e professores brasileiros são preocupantes. Em 2018, a Secretaria Municipal de Educação emitiu 3.055 licenças por doenças relacionadas ao estresse e à depressão. No município do Rio de Janeiro, por exemplo, um professor é licenciado a cada três horas por doenças ligadas ao estresse.
Uma equipe de pesquisadores do Grupo de Estudos Interdisciplinar sobre Violência (Greivi) da Universidade de São Paulo (USP) elaborou uma cartilha gratuita sobre violência escolar que orienta profissionais a lidar com o problema. O material aponta os principais impactos da violência escolar na saúde:
Sintomas psicossomáticos como dores de cabeça, tontura, náusea, diarreia, enurese, sudorese, taquicardia, dores musculares, alterações no sono (insônia ou sono excessivo)
Estresse que pode aumentar a vulnerabilidade a doenças diminuindo a resistência imunológica
Questões de saúde mental como ansiedade, medo, raiva, irritabilidade, inquietação, cansaço, insegurança, isolamento, impotência, rejeição, tristeza, angústia, baixa autoestima, depressão e pensamentos suicidas, entre outros
Prejuízo na socialização, aumentando o isolamento social, gerando insegurança que pode afetar a confiança no outro, a capacidade de se expressar em público, de resolver conflitos e tomar decisões.
O material cita a implementação de projetos em uma escola de Ribeirão Preto, no interior paulista, para desenvolver autoestima, tolerância e cooperação entre estudantes. A escola foi escolhida devido ao alto índice de violência no local e às dificuldades no processo de ensino-aprendizagem. A cartilha apresenta ainda a importância de adotar medidas preventivas contra a violência, que embora sejam focadas nos alunos, impactam o clima escolar como um todo e promovem de maneira positiva mais saúde mental nas instituições de ensino.
O tema de violência nas escolas é complexo e multifatorial. Poderíamos estender o debate a respeito das condições de risco e vulnerabilidade em que se encontram inúmeras escolas brasileiras. Analisar a fundo o impacto das condições familiares de alunos que apresentam comportamento violento, e refletir sobre os aspectos psicológicos relacionados à impulsividade e à regulação da raiva em adolescentes. Contudo, embora sejam todos temas relevantes, é inaceitável que a escola seja palco de violência contra o professor. Seja moral, pela intimidação desses profissionais, ou física, como lamentavelmente seguimos liderando rankings internacionais.

Ana Carolina C D'Agostini é psicóloga e pedagoga com formação pela PUC-SP, especialização em psicologia pela Universidade Federal de São Paulo e mestre em Psicologia da Educação pela Columbia University. Trabalha como consultora de projetos em competências socioemocionais e é consultora do projeto de Saúde Emocional da Nova Escola.

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