segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Estrutura precária do Conselho Tutelar dificulta atendimento.


A grande demanda de atendimentos ligada à estrutura insuficiente dificulta ações do Conselho Tutelar no combate aos maus-tratos de crianças e adolescentes em Campo Grande.

Segundo o presidente da Associação dos Conselhos Tutelares de Campo Grande, Adriano Vargas, há um grande volume de ocorrências na Capital e só com uma rede de atendimento à criança envolvendo segurança pública, sistema de saúde e conselho tutelar é possível atender esta demanda.

“O conselho atendeu nestes últimos três anos mais de 40 mil ocorrências. Quase 20 mil delas foram na região sul do município, que é a mais pobre, populosa e vulnerável de Campo Grande”, disse Vargas.

Tendo atualmente cinco conselhos tutelares na cidade, para atender uma população de quase 950 mil pessoas, Adriano Vargas declara que a sociedade deve estar atenta às mudanças de comportamento das crianças.

“A sociedade deve perceber qualquer movimento de mudança de comportamento da criança, algo atípico, e notificar isso ao Conselho tutelar. Eles devem acionar a polícia, para que seja feito o atendimento inicial e a gente possa acompanhar a família de forma sistemática”, destacou o conselheiro.

Questionado sobre as formas possíveis de perceber as mudanças no comportamento da criança que pode estar sofrendo algum tipo de violência doméstica, Adriano relata que atitudes mais retraídas e introspectivas são comuns em casos de agressões.

 “Às vezes, a criança tem uma mudança abrupta de comportamento, em que ela se torna introspectiva, retraída e procura não manter contato com outras pessoas. É possível também encontrar sinais de lesões, hematomas. A maior parte destas violências é feita justamente de pessoas próximas ao convivo”, salientou Vargas.

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CASO MAIS RECENTE

Stephanie de Jesus Dada Silva, 24 anos, e Christian Campocano Leitheim, 25 anos, mãe e padrasto de uma menina de dois anos, foram presos por suspeita de estupro e homicídio da criança, na noite de quinta-feira (26), em Campo Grande.

De acordo com a titular da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), Anne Karine Trevisan, a polícia foi acionada após a criança dar entrada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Bairro Coronel Antonino com vários ferimentos pelo corpo e já sem vida.

As agressões eram rotineiras, segundo indica prontuário médico da menina, com mais de 30 procedimentos feitos no hospital. Em uma das ocasiões, a criança deu entrada na unidade de saúde em decorrência de uma fratura na tíbia.

Além disso, o pai da menina já havia registrado vários boletins de ocorrência por maus-tratos, ao notar hematomas na filha quando ela ia para a casa dele. “Essa criança tinha vários sinais de agressão física e suspeita de ter sido abusada sexualmente”, disse a delegada.

“Ela estava com a barriga bastante inchada e tinha muitas lesões nas costas, no corpo também, pode ter sido hemorragia interna, só o exame necroscópico vai apontar a causa da morte”, acrescentou.

O corpo da menina foi encaminhado para o Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol), onde passou por perícia que apontará se ela foi vítima de estupro.

O homem já tinha passagens pela polícia por violência doméstica contra a ex-mulher. Já a mãe tem duas passagens por maus-tratos.

Eles foram presos em flagrante por homicídio qualificado por motivo fútil e estupro de vulnerável.

Questionado pela reportagem se este caso pode ser considerado uma negligência por parte do sistema de saúde ou pelo próprio conselho, Adriano Vargas disse que pelo volume de ocorrências é complicado o

Conselho deter todas as informações de todos os atendimentos.

“O sistema de saúde atua por sistema de plantão, quem atende hoje pode não ser o mesmo que atende amanhã. É importante que o sistema converse sempre que envolver crianças e adolescente, a saúde já tem o hábito de informar o conselho em alguns casos”, afirmou Vargas.

Na tarde de sexta-feira (27), os dois suspeitos tiveram a prisão convertida em preventiva. 

SINAIS DE VIOLÊNCIA

Ao Correio do Estado, o médico pediatra Alberto Costa destacou que a quantidade de vezes que a criança foi levada aos hospitais em um período de dois anos é, no mínimo, “fora do normal”, principalmente pelo fato de a menina não apresentar nenhum tipo de doença grave que exigisse acompanhamento médico constante.

“Este número de atendimentos médicos que essa criança recebeu está anormal, principalmente para quem não tinha nenhuma doença grave”, disse Costa, que deixou claro que nos casos em que o médico desconfia ou até mesmo constata, por meio de aspectos físicos, que a criança está sofrendo maus-tratos a atitude mais acertada é acionar a Justiça para que providências sejam tomadas.

PEDIDOS DE GUARDA
Informação do Conselho Tutelar da Região Norte de Campo Grande mostra que o pai da menina de dois anos, morta por maus-tratos na quinta-feira (26), buscou a guarda da filha. Um boletim de ocorrência foi feito há um ano e apresentado ao Conselho Tutelar.

De acordo com o Conselho Tutelar, na busca pela guarda da filha, o pai da criança tentou ficar responsável por ela.

Ele foi encaminhado à Defensoria Pública e ao Conselho Tutelar, que realizou visita técnica, mas, na ocasião, a criança não tinha nenhum indício de maus-tratos. Nesta visita, foi constatada que a criança não tinha marcas e nem hematomas e, por ser muito pequena, não falava.

O Conselho Tutelar informou, ainda, que a mãe foi devidamente orientada quanto aos cuidados e a proteção.

No dia 8 de maio do ano passado, o pai procurou o Conselho Tutelar e, mais uma vez, alegou que precisava de documentos de atendimento para apresentar à Defensoria. Outra vez, o pai disse que tinha visto hematomas na filha.

Diante da insistência do pai, o Conselho Tutelar e a equipe técnica realizaram uma tentativa visita à criança nos dias 7 e 8 de maio, porém, sem sucesso.

Uma notificação de comparecimento foi deixada no dia 9 de maio, que, segundo o Conselho Tutelar, foi cumprida pela mãe da criança. Ela apresentou todos os documentos da criança, como a carteira de vacina em dia.

DISQUE 100
Mato Grosso do Sul registrou 1.862 denúncias realizadas no Disque 100 no ano passado. Do número total, situações envolvendo crianças e adolescentes somaram 918 contatos, liderando os casos denunciados dentro do Estado – são 49% das denúncias.

O Disque 100 é um canal da política dos direitos humanos e atende graves situações de violações que acabaram de ocorrer ou que ainda estão em curso, acionando os órgãos competentes e possibilitando o flagrante.

O serviço também recebe denúncias pelo aplicativo WhatsApp, no número (61) 99656-5008. (Colaboraram Leo Ribeiro, Ana Clara Santos e Elias Luz)

Saiba: O governo federal sancionou uma nova lei em 24 de maio de 2022, intitulada Henry Borel, que cria mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, nos termos do § 8º do art. 226 e do § 4º do art. 227.

Fonte: Correio do Estado



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