sexta-feira, 12 de junho de 2020

Crianças e adolescentes explorados no trabalho infantil migram para a mendicância durante pandemia

 (Foto: Nando Chiappetta)


As crianças e adolescentes explorados no trabalho infantil nas áreas urbanas também observaram, como os adultos, as alternativas de serviço escaparem durante a pandemia do novo coronavírus. Com menos gente nas ruas e estabelecimentos fechados, os meninos e meninas migraram para a mendicância nos mercados e farmácias, mantidos abertos por serem considerados serviços essenciais. A atividade, no entanto, também é enquadrada como trabalho infantil pela legislação brasileira. Nesta sexta-feira (12), são lembrados em todo o mundo os malefícios do trabalho infantil para o crescimento saudável das crianças e adolescentes.

“O trabalho infantil se refere às atividades econômicas ou de sobrevivência, com ou sem finalidade de lucro, remuneradas ou não, realizadas por crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos. A exceção é para a condição de aprendiz, a partir de 14 anos”, explica Jailda Pinto, da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente da Procuradoria Regional do Trabalho 6ª Região.

Muitas crianças trabalhadoras, diz Humberto Miranda, coordenador da Escola de Conselhos de Pernambuco, encontraram  apoio nos coletivos formados para distribuir alimentos. “Mas a sociedade precisa perceber que a distribuição de cestas é uma demanda emergencial e não deve ser uma prática cotidiana. Esse ato não resolve o problema do trabalho infantil.”

Ao mesmo tempo, é preciso estar atento às condições dessas crianças e adolescentes explorados no trabalho, em sua maioria, pobre, negra e periférica. “Elas estão nas ruas porque passam fome em casa ou por não terem casa ou moradia digna. Desse modo, não há como reproduzir o discurso disciplinador e higienista em relação ao cotidiano desses meninos e meninas. Elas estão com fome, estão cansadas, enfrentam o distúrbio de sono, vivem irritadas, com sérios problemas respiratórios, em consequência das condições desumanas, inclusive, muitas são exploradas sexualmente. Este é o cenário”, alerta.

André Torres, conselheiro tutelar do Recife e representante do fórum colegiado nacional de Conselheiros Tutelares - FCNCT, diz que esses meninos e meninas em situação de pobreza também têm sido empurrados para a mendicância nas ruas durante a pandemia porque uma parcela grande das famílias não conseguiu o auxílio emergencial. “Desse jeito, fica praticamente impossível o sustento da família. Alguns provedores estão entrando em desespero por conta da situação.”

Trabalho doméstico
Ao passarem mais tempo em casa com os responsáveis, as crianças e adolescentes também terminam convocados a assumirem com mais frequência os cuidados com os irmãos mais novos e com os afazeres da casa. Existem diferenças entre um afazer doméstico e o trabalho infantil.

“Quando a criança assume uma tarefa dentro de casa junto com os outros membros da família, isso não é trabalho. Mas assumir os irmãos mais novos, as responsabilidades dos adultos da casa, seja por pobreza familiar, seja por uso de drogas desses responsáveis, isso é trabalho infantil e precisa ser combatido”, destacou o procurador Antônio Oliveira, do Ministério Público do Trabalho do Ceará e da Rede Peteca.

“Não há controle do trabalho infantil doméstico, considerado pela Organização Internacional do Trabalho como uma das formas mais danosas de trabalho infantil. O que o procurador reconhece como trabalho, identifico como outra forma de problema social, marcada pela responsabilidade precoce que muitas famílias pobres são  obrigadas a vivenciar”, raciocina Humberto Miranda.

Este ano, o tema da campanha nacional contra o trabalho infantil é Covid-19. Agora, mais do que nunca, protejam crianças e adolescentes do trabalho infantil. “Não podemos também culpabilizar os pais e mães pobres porque não existem vagas de emprego para esses adultos. Temos que falar de políticas de qualificação, trabalho e geração de renda para essas pessoas. O trabalho infantil é porta de entrada para várias violações, como prática de atos infracionais e exploração sexual”, destaca Jailda Pinto. A responsabilidade com o sustento e garantia de outros direitos cabe aos responsáveis pela crianças, destaca. “Inclusive, não é todo pai e mãe pobre que coloca os filhos para trabalhar. Muitos assumem esse papel de uma forma ou de outra.”

Uma forma de contribuir com o combate ao trabalho infantil é doar ao fundo municipal dos direitos da criança e do adolescente 6% do imposto de renda devido. A verba é usada em programas para crianças em situação de vulnerabilidade. Dar esmolas ou comprar artigos de crianças e adolescentes somente perpetua a miséria da população preta e pobre. Outra alternativa é denunciar exploração do trabalho infantil através de uma ligação para o Disque 100 ou conselhos tutelares da região.

“Precisamos acabar com o ciclo intergeracional da pobreza. As crianças que trabalham hoje são filhos e filhas de adultos que trabalharam precocemente. Isso acontece porque a abolição dos negros e negras aconteceu desacompanhada de políticas públicas de educação para as crianças e qualificação para o trabalho adulto, além de políticas públicas de moradia e saneamento”, pontua a procuradora.

Entre as orientações do MPT aos municípios para combater o trabalho infantil durante a pandemia estão a adoção de medidas emergenciais de mapeamento e identificação de vínculos familiares e acionamento do serviço social para evitar a contaminação entre as crianças e adolescentes; cadastramento das famílias em políticas públicas; oferta de informação para as famílias sobre o coronavírus e uso de máscara, além de entrega de alimentação nas escolas, mesmo com as unidades fechadas

fonte:https://www.diariodepernambuco.com.br

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