sexta-feira, 10 de abril de 2020

Faltam leitos de UTI no interior de Pernambuco para responder à expansão do coronavírus

(crédito: Marcello Casal Jr / Agência Brasil)

O novo coronavírus evidenciou ainda mais o problema histórico dos vazios assistenciais no interior do Brasil. Em Pernambuco, das 12 regionais de saúde, três sequer têm leito de UTI no SUS: Afogados da Ingazeira, Goiana e Ouricuri. Outras oito estão abaixo do mínimo desejável. Somente a regional do Recife ultrapassa os requisitos estabelecidos pelo Ministério da Saúde.
A pouca infraestrutura em cidades vulneráveis que já sofrem com a escassez de recursos para o financiamento da saúde expõe a população aos perigos da “interiorização” da Covid-19. São locais que tendem a uma rápida sobrecarga do sistema com a evolução da epidemia e municípios em que o cenário de emprego e renda dificulta o isolamento.
A estimativa mundial é que 20% dos casos graves da infecção irão demandar acesso à rede hospitalar e 5% dos infectados precisarão acessar leitos de UTI.
As informações que abrem esta matéria são da nota técnica do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) sobre as necessidades de leitos de UTI, respiradores e ocupação hospitalar no SUS em todas as regionais de saúde do país em preparo ao novo coronavírus.

O instituto se baseou na comparação com os requisitos mínimos listados em portarias do Ministério da Saúde. Para o número de leitos de UTI, adotou-se como o mínimo desejável a quantidade de 10 leitos por 100 mil usuários.
Em Pernambuco, na maioria das regionais basta que uma pequena parcela da população seja infectada para causar uma lotação dos leitos de UTI, com destaque para Limoeiro (2%), Arcoverde (3%), Palmares (5%) e Garanhuns (5%). Isso sem contar com as três regionais que não têm leitos de UTI no SUS e, portanto, nem entraram nesse cálculo.
Cada regional, que conta com uma gerência, abarca a sede e municípios ao redor, somando os 185 municípios do estado.
Os cálculos do Ieps utilizaram números do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e, portanto, estão sujeitos a erros de reporte. A nota técnica não levou em consideração os anúncios recentes feitos pelo Governo de Pernambuco. Conheça-os mais abaixo e saiba que investimentos o estado vem fazendo para ampliar e descentralizar a infraestrutura.
“As regiões de saúde melhor equipadas são aquelas que abarcam as capitais, enquanto as regiões de menor preparo e mais vulneráveis encontram-se majoritariamente no interior. Dessa forma, uma ‘interiorização’ da pandemia requer uma ação ao nível regional ou macrorregional e um preparo do ponto de vista operacional ainda maior. Esperamos que o planejamento e a gestão da resposta à Covid-19 seja coordenado entre entes federativos o máximo possível, para que essas regiões mais vulneráveis sejam levadas em conta”, diz Beatriz Rache, do Ieps e uma das seis pessoas que assinam a nota técnica. Ela é economista com mestrado pela Columbia University, em Nova York.
“Quando olhamos o mapa, ficamos chocados”, lamenta Adriana Falângola, professora da área acadêmica de medicina social no Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da UFPE. “E olhe que o estudo foi bem conservador. Eu imagino que o que eles apresentam é, do ponto de vista da realidade, ainda mais grave”, observa sobre os parâmetros mínimos utilizados.
Adriana, que também é líder do Grupo de Pesquisa de Economia Política da Saúde (CNPQ), comenta que, em Pernambuco, cada Gerência Regional de Saúde (Geres) conta com um hospital no mínimo de médio porte. São nessas unidades que, teoricamente, estão os leitos públicos de UTI.
Ou deveriam estar, já que eles não existem em alguns lugares para atender, por exemplo, localidades como Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi, Moreilândia, Ouricuri, Parnamirim, Santa Cruz, Santa Filomena e Trindade.
Esses 11 municípios do Sertão fazem parte da regional de Ouricuri, uma das três sem leitos de UTI no SUS, e são alguns dos mais distantes da capital. Em Ipubi, já houve um caso confirmado da Covid-19. O paciente de 47 anos teve cura clínica e já está em casa, segundo a prefeitura
Fora da Região Metropolitana do Recife, há casos confirmados do novo coronavírus em Vitória de Santo Antão, Bom Jardim, Carpina, João Alfredo, Lagoa do Carro, Limoeiro, Paudalho, Passira, Catende, Palmares, Belo Jardim, Caruaru, Cachoeirinha, Frei Miguelinho, Garanhuns, Capoeiras, Arcoverde, Salgueiro, Petrolina, Ipubi, Aliança, Goiana, Macaparana e Timbaúba.
“Espero que essa tristeza que estamos vivendo sirva de fato para conseguirmos operacionalizar a chamada ‘regionalização da saúde’, para garantir o atendimento mesmo que considerando parâmetros muito tímidos. Mas que esse mínimo garanta ao menos o básico”, pontua Adriana.
“É preciso enfatizar que os vazios assistenciais existem desde sempre e não são uma particularidade do estado de Pernambuco. Há uma concentração da oferta nas capitais e em torno dela por vários motivos, desde o local de formação até o maior acesso à educação e lazer para as famílias. A internet e a telesaúde melhoraram bastante o cenário, mas não modificaram a estrutura”, critica.
Uma vez que a rede não comporta atender a todos ao mesmo tempo, o isolamento segue sendo a principal estratégia para evitar que mais gente seja contaminada e o sistema de saúde entre em colapso já nas próximas semanas.

A sobrecarga no Recife

A situação menos dramática em termos de infraestrutura de saúde é a do Recife. Mas, ressalta Adriana, é importante observar que a regional da capital (I) não atende apenas os pacientes da cidade. Quem não encontra atendimento nas suas respectivas localidades tende a recorrer ao Recife.
O secretário de saúde de Pernambuco, André Longo, já declarou que, até o início do próximo mês, o cenário é de “aceleração descontrolada” da transmissão da Covid-19, o que deve levar à sobrecarga do sistema entre a última semana de abril e a primeira semana de maio. “Serão dois meses duríssimos”, afirmou Longo.
Nesta semana, o estado atingiu a marca de 80% dos leitos totais de UTI direcionados para pacientes com o novo coronavírus.
fonte: http:marcozero.org

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