quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Diagnósticos dos problemas de 26 municípios são entregues a promotores de Justiça no evento Retratos da Cidadania

30/10/2019 - Os diagnósticos do contato direto entre o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) e a população de 26 municípios estaduais, para coletar depoimentos e queixas da vivência dos moradores, foram entregues, nesta terça-feira (29), aos promotores de Justiça dos municípios visitados. O evento Retratos da Cidadania, resultado do projeto institucional Cidadania com Vez e Voz, ocorreu no Centro Cultural Rossini Alves Couto e reuniu membros e servidores do MPPE, integrantes de movimentos sociais, conselhos municipais e estaduais, lideranças comunitárias e sociedade civil para palestras e debates sobre vários recortes referentes à cidadania.
Durante 2019, o Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Defesa da Cidadania (Caop Cidadania) ouviu mais de 2.200 pessoas (entre estudantes, religiosos, profissionais liberais, donas de casa, gestores públicos, etc.) nas cidades pernambucanas, distribuindo formulários e apurando reclamações. As cidades foram: Aliança, Buenos Aires, Itambé, Ferreiros, Itaquitinga, Nazaré da Mata, Brejo de Madre de Deus, Camocim de São Félix, Sairé, São Caetano, Taquaritinga do Norte, Santa Cruz do Capibaribe, Riacho das Almas, Ibirajuba, Panelas, Cupira, Caruaru, Água Preta, Belém de Maria, Quipapá e Palmares. A população do bairro de Três Carneiros também foi ouvida no primeiro Cidadania com Vez e Voz no Recife.
“Todos os Ministérios Públicos do Brasil deveriam se aproximar urgentemente da sociedade e abraçar os movimentos populares. Precisamos estar nas escolas, nas comunidades, colhendo subsídios para que os promotores de Justiça se dediquem a garantir os direitos do cidadão”, alertou o procurador-geral de Justiça do MPPE, Francisco Dirceu Barros. Ele considera a cidadania como fundamental para a atuação do MP na época em que vivemos. “A cidadania é multifacial. Diversas áreas do Ministério Público, como saúde, consumidor, meio ambiente, direitos humanos, pendem para ela. No próximo ano, último da minha gestão, pretendo que seja direcionado para a cidadania. Vamos realizar o 1º Congresso Nacional de Cidadania no MPPE”, antecipou o procurador-geral de Justiça.
O diretor da Escola Superior do MPPE, o procurador de Justiça Sílvio Tavares, relembrou que a Constituição Brasileira, promulgada em 1988, foi apelidada de Constituição Cidadã. “Foi recebida como inovadora por abarcar conceitos de igualdade e formação de políticas públicas para garantir a cidadania. Esse trabalho do Caop Cidadania mostra as necessidades e aflições das comunidades e motiva o MPPE a trabalhar pela efetivação dessas políticas”, avaliou Sílvio Tavares.
Com o material recolhido através dos depoimentos, denúncias e questionários aplicados, o Caop Cidadania identificou eixos de demandas sociais para otimizar a atuação ministerial. “Era uma vontade minha chegar perto da sociedade, levar o MPPE para perto da sociedade, aos locais que precisam muito dele. O MPPE tem que ser percebido pelo cidadão como uma instituição que o protege. É o Estado sendo visto não só como repressão, mas como prevenção”, revelou a coordenadora do Caop Cidadania, a promotora de Justiça Dalva Cabral.
Os problemas mais citados nas apurações do Caop Cidadania foram o bullying (75%), a discriminação (74%) e a violência doméstica ou familiar (53%). “Chegar junto ao povo e ouvir diretamente dele suas queixas e sugestões é o Ministério Público exercendo uma de suas atividades primordiais”, avaliou a promotora de Justiça Maria José Queiroz, que atua em Nazaré da Mata. “Com esse relatório, ganhamos mais munição para conhecer e resolver os problemas sociais. A iniciativa do Caop Cidadania nos favoreceu muito”, atestou o promotor de Justiça Leandro Guedes, atuante em Belém de Maria.
Retratos da Cidadania – Projeto Cidadania com Vez e Voz
Debates - A programação de discussão de demandas sociais foi composta por quatro palestras/debates. A primeira foi “Onde começa a temerária e silenciosa violência que silencia, machuca e mata mulheres no Brasil?”, que teve como palestrante a deputada estadual e delegada Gleide ngelo e, como debatedora, a secretária da Mulher do Estado de Pernambuco e médica, Sílvia Cordeiro. “Vivemos uma cultura machista que insiste em se perpetuar porque ela confere poder ao homem sobre a mulher. Trata-se de uma cultura que se reproduz por gerações, onde a mulher é ensinada a ser fraca e convencida de que é desequilibrada. Já o homem é ensinado que todo comportamento visto como feminino, o caso de chorar, é sinônimo de fraqueza”, analisou Gleide ngelo.
A deputada estadual recordou que em 15 anos como delegada sempre ouviu de mulheres declarações de medo do companheiro. “A mulher é criada para ser medrosa. Para ser emocionalmente dependente do homem. Podem até ser independente financeiramente e realizada profissionalmente, mas acredita que sem o homem, não poderá viver”, revelou Gleide ngelo. “É tão forte essa cultura de dependência emocional que a mulher vítima de violência que se afasta de um agressor considera que sua vida acabou.”
Já Sílvia Carneiro mencionou o déficit de direito que a sociedade carece. “A sociedade é feita de diversos grupos, com demandas diferentes. Cidadania é a possibilidade de conviver com as diferenças e entendê-las como necessidades específicas. As relações precisam se basear na equidade”, afirmou.
O promotor de Justiça do Ministério Público do Ceará, atual coordenador da Comissão Permanente de Defesa de Direitos Humanos em Sentido Estrito (COPEDH), do Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH), Enéas Vasconcelos, explanou sobre o tema “Políticas Públicas eficientes são a garantia da cidadania sustentável. Papel do(a) promotor(a) de Justiça”, e para debater foi convidado o coordenador do Núcleo de Inovação Social em Políticas Públicas, Sérgio Kelner.
Ambos reforçaram a importância do diálogo com os setores sociais para se encontrar a solução do problema em questão. “Até mesmo um processo penal deriva do respeito aos direitos humanos. Caso contrário, o acusado já seria sentenciado e, talvez, executado sem qualquer direito à defesa ou trâmite processual”, pontuou Enéas Vasconcelos. Sérgio Kelner atentou para o desgaste do tecido social que o atual cenário brasileiro apresenta e a crise nas instituições. “O principal problema brasileiro continua sendo as desigualdades. Em meio às inovações tecnológicas, precisamos desenvolver inovações sociais com foco em qualidade de vida e bem-estar social”, ponderou.
Já na palestra “O combate à discriminação, por qualquer das suas formas, não prescinde do enfrentamento e da emergente cultura de paz”, ministrada pelo mediador e fundador da Ibramac (Câmara de Mediação e Arbitragem), Jean Carlos Lima, e que teve como debatedora a professora da Unicap e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM-PE), Maria Rita de Holanda, foram discutidos temas como bullying, comunicação violenta, falta de comunicação, falta de escuta ativa, preconceitos, agressões, etc.
“No dia a dia, usamos palavras violentas e não escutamos o nosso interlocutor. Para haver paz é preciso educação para a paz”, resumiu Jean Carlos Lima. Maria Rita de Holanda levantou a questão de que o preconceito no Brasil deve-se a uma história de colonização violenta, que ainda mantém uma tradição de discriminações na sociedade. “Temos lei de combate ao bullying, as escolas são obrigadas a ter programas contra o bullying”, avisou ela. “Somos um país de vulneráveis, onde mulheres, pessoas negras e indígenas, comunidade LGBT precisam de políticas públicas para garantia de direitos e proteção”, ressaltou Maria Rita de Holanda, salientando que a cultura de paz não pode servir para amansar as lutas dos movimentos sociais.
Por fim, o secretário estadual de Políticas de Prevenção à Violência e Drogas, Cloves Benevides, ministrou a palestra “Drogas: Desafio das famílias e das políticas públicas”, e contou como debatedor o gerente estadual de Atenção à Saúde Mental da Secretaria Estadual de Saúde, João Marcelo Costa.
“As soluções que têm surgido para o problema complexo do consumo e tráfico de drogas são, na maioria das vezes, simplistas e superficiais. Hoje, especialmente, o Brasil ideologizou mais que nunca esse debate, onde prevalece o discurso moral. Continuamos prendendo o jovem, negro, de periferia, que vive em desassistência”, concluiu Cloves Benevides. “Temos que romper com a lógica de focar somente na substância e tratar do usuário, sob a ótica do cuidado. As demandas do usuário são muito complexas e individuais. O que podemos trazer de proposta nova para o usuário? A prática criminalizadora e de exclusão nunca se mostrou eficaz para ninguém”, expressou João Marcelo Costa.

FONTE: WWW.MPPE.MP.BR.

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