A Câmara de Vereadores de Campo Mourão aprovou recentemente a criação de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para apurar a atuação do Conselho Tutelar em uma comunicação de violação de direitos nas últimas semanas, envolvendo suposta agressão a uma criança de 9 anos, que teria sido espancada pela avó com um pedaço de madeira, em uma residência no Jardim Lar Paraná. O caso ganhou repercussão após o morador de Campo Mourão Luciano Pires tornar pública uma acusação contra a presidente do Conselho Tutelar, Paloma Mendonça. Ele informou que a denunciou ao Ministério Público por suposta prevaricação no atendimento da ocorrência.
A conselheira, que estava de plantão na noite em que o próprio denunciante comunicou a suposta violação de direitos, em 16 de maio, uma sexta-feira, afirmou, em entrevista exclusiva à TRIBUNA, que ainda não foi oficialmente notificada. “Não tem nenhum ato formal que eu esteja respondendo processo por prevaricação”, disse. Ela acrescentou que, durante uma visita domiciliar realizada por ela na semana seguinte ao comunicado, não identificou sinais de agressão na criança. “Fui na casa, vi a criança, ela não tinha nenhuma marca”, relatou.
Segundo o vereador Márcio Berbet, autor da proposta de criação da comissão investigativa, o objetivo da comissão é apurar os fatos, considerando que os documentos do Conselho Tutelar relacionados ao caso estão protegidos por sigilo legal
Segundo o vereador Márcio Berbet, autor da proposta de criação da comissão investigativa, o objetivo da comissão é apurar os fatos, considerando que os documentos do Conselho Tutelar relacionados ao caso estão protegidos por sigilo legal. Ele ressaltou que o requerimento foi apresentado por entender que é dever de cada legislador municipal exercer a função de fiscalização. “A Comissão Parlamentar de Inquérito não serve só para punir”, esclareceu.
Agora, será feita uma apresentação dos líderes de bancada para escolha dos componentes. Em seguida, serão selecionados o presidente e relator da comissão. Com os líderes definidos, os trabalhos serão iniciados, com ofícios para oitiva de pessoas, assim como acesso aos documentos. Por fim será dado andamento à apuração e ao levantamento dos fatos para a produção do relatório final.
A instância parlamentar criada para averiguar as denúncias ocorrerá paralelamente aos procedimentos para apuração dos fatos que já estão sendo realizados pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). Em caso de denúncias sobre irregularidades praticadas por conselheiros tutelares, esse é o órgão responsável por fiscalizar o Conselho Tutelar, conforme pontua o Artigo 102 da Lei Municipal nº 3.605/2015.
“Informamos que o CMDCA já iniciou os procedimentos para apuração dos fatos através da comissão permanente existente, a qual trabalha para averiguar, fiscalizar e tomar as medidas necessárias às denúncias recebidas. Reafirmamos nosso compromisso com a ética, a legalidade e a transparência – princípios que norteiam todas as ações deste Conselho”, anunciou a presidência do CMDCA, por meio de nota, no dia 29 de maio.
O caso está sendo investigado, ainda, pela Delegacia da Mulher de Campo Mourão, que informou à TRIBUNA que a situação só chegou a conhecimento da unidade policial no dia 4 de junho, após ser comunicada sobre uma denúncia realizada de forma anônima, via Disque 100. “Em seguida, o Ministério Público encaminhou elementos de informação para melhor subsidiar a investigação”, informou a equipe policial responsável pela investigação.
A partir disso, um inquérito policial foi instaurado, com a determinação de diligências, incluindo escuta especializada da vítima, oitiva de testemunhas e expedição de ofícios. “No que diz respeito a eventual acompanhamento que não envolva apuração criminal, trata-se de atribuição da rede de proteção”, explicou o órgão de segurança pública. Por isso, a criança e a família também estão sendo acompanhadas pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) do município.
Ainda conforme a resposta da Delegacia da Mulher ao jornal, devido ao sigilo do inquérito e à necessidade de resguardar as investigações, o conteúdo apurado – como a confirmação ou não de que a criança foi agredida com uma ripa pela avó – não poderá ser divulgado nesse momento.
“Eu estou bem segura, uma vez que tem todo o rol comprobatório e documental”, afirma a presidente
Diante da informação sobre a criação da CEI na semana passada, a presidente do Conselho Tutelar se pronunciou publicamente pela primeira vez sobre o caso envolvendo o órgão de proteção da criança e do adolescente. À TRIBUNA, ela disse que está com a consciência tranquila. “Eu estou bem segura, uma vez que tem todo o rol comprobatório e documental”, afirmou. “Eu espero que seja uma comissão justa, transparente e que traga a verdade”, acrescentou.
Ela falou, inclusive, sobre a denúncia de Luciano Pires. “Eu não vejo problema nenhum nesse tipo de denúncia que foi feita, porque todo cidadão tem o direito de fazer a denúncia que bem entender. A questão maior é: eu quero deixar muito claro que essa criança não foi espancada com ripa e que ela passa bem”, apontou.
Em seu relato, a conselheira confirmou a versão inicial do responsável pela comunicação de que ele entrou em contato com ela, em seu plantão, na noite do dia 16 de maio, duas vezes. Na primeira chamada, Paloma informou que o denunciante passou apenas o nome da rua, sem informar o número da residência. Devido à instabilidade da ligação e à dificuldade de compreensão, ele realizou uma segunda chamada.
Nesse segundo contato, a conselheira informou que o cidadão comunicou já ter acionado a Polícia Militar e forneceu o número da residência onde o fato estaria ocorrendo. Recentemente, o denunciante relatou a este veículo de comunicação que a agressão teria acontecido por volta das 20 horas e o contato com a conselheira foi aproximadamente às 20h24. “Esperei no local até por volta das 22h30 e ninguém apareceu. Depois disso, vi que a situação tinha sido controlada”, comentou Luciano.
Paloma, no entanto, informou que realizou o atendimento de praxe, coletando o endereço exato da residência para registro, porém, como se tratava de uma denúncia de crime, ela não foi até o local naquela noite. “Eu colhi os dados, mas, em momento nenhum, eu falei que estava em outra ocorrência ou vou agora, não vou agora”, disse. “Toda vez que tem um crime, o destinatário dessa informação, dessa denúncia, é a polícia, porque eu não tenho um colete nem arma”, sustentou a então plantonista.
A Delegacia da Mulher de Campo Mourão informou que não há registro da suposta ocorrência naquela noite. “Em consulta ao sistema, não foi localizado boletim de ocorrência referente aos fatos em questão”, informou a unidade policial
A Delegacia da Mulher de Campo Mourão informou que não há registro da suposta ocorrência naquela noite. “Em consulta ao sistema, não foi localizado boletim de ocorrência referente aos fatos em questão”, informou a unidade policial. “A questão do acionamento está sendo apurada no inquérito policial instaurado para investigação dos fatos”, acrescentou.
Semana seguinte
Na segunda-feira seguinte, dia 19, Paloma folgou após cumprir plantão de sexta-feira (16) a domingo (18). Nesse dia, Luciano compareceu à sede do Conselho Tutelar cobrando providências. Ele foi atendido por outras conselheiras presentes no local, que registraram seu relato sobre a conduta da plantonista do final de semana em ata.
Ainda naquela segunda-feira, após tomarem conhecimento da possível agressão sofrida pela criança, duas das conselheiras em trabalho foram até a residência informada pelo morador. Uma delas, que preferiu não se identificar, relatou à TRIBUNA a ação de ambas.
“Nós fomos até o local realmente, atendemos e vimos a situação da criança, tomamos todas as medidas que são pertinentes”, afirmou a conselheira que estava em serviço naquele dia, ressaltando que não poderia detalhar os procedimentos adotados por serem sigilosos. “O que era possível fazer naquele momento, devido ao lapso temporal de três dias, nós tomamos essas medidas”, informou.
Por volta das 12 horas, Paloma foi comunicada sobre o comunicado da suposta agressão. “Na segunda, me ligaram e falaram que teve uma comunicação de violação de direitos na rua tal, no endereço tal. Eu disse: ‘olha, eu recebi uma na sexta à noite, mas em número divergente’”, observou, ao informar que, posteriormente, identificou que se tratava da mesma notificação, constatando que o número da casa comunicado pela primeira vez estava incorreto.
A presidente disse que, quando foram ao local, as duas conselheiras deixaram uma notificação para a avó da criança comparecer à sede do Conselho Tutelar na sexta-feira (23). “Elas foram na segunda, quando o senhor Luciano veio aqui, mas notificaram a avó para vir na sexta. De segunda para sexta, tem um lapso de quase cinco dias. Se essa criança tivesse sido espancada, jamais elas teriam essa conduta, porque ela podia apanhar até o dia do agendamento”, defendeu Paloma.
Na terça-feira (20), quando a presidente voltou ao trabalho e não identificou medidas de proteção à criança, mesmo diante da suspeita de agressão, ela decidiu encaminhar o caso ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e ao Ministério Público.
Além disso, agendou uma visita com a família para quinta-feira (22), quando foi até o endereço acompanhada de outra conselheira, Ronise Cleia Galdino. No local, ambas disseram que tiveram contato com a criança e que não havia nenhuma marca de agressão nela. “Se tivesse com hematomas, a gente ia pedir um exame de corpo de delito e registrar o boletim de ocorrência, mas não precisou pedir e nem registrar boletim”, atestou Ronise.
Paloma relatou, ainda, que o menino falou que a avó havia dado duas chineladas nas nádegas dele. Perguntada, a avó confirmou que realmente bateu com um chinelo de E.V.A. na região das nádegas do neto por conta de uma desobediência. “Por mais que sejam só duas chineladas, é um tipo de agressão”, pontuou a conselheira. “Quando eu vi que a criança ainda não tinha sido atendida, eu fiz encaminhamentos aos Creas e ao Ministério Público e fiz advertência à avó”, informou.
“Eu que comuniquei os fatos ao Ministério Público, pois, até então, ele não sabia. O Ministério Público teve acesso à comunicação do Luciano depois da minha comunicação”, alegou ela. Na sexta-feira (23), Paloma fez um comunicado formal ao colegiado sobre os encaminhamentos realizados por ela e que havia cancelado o agendamento com a avó naquele dia, entendendo que a rede de proteção já estava ciente da situação e adotando as providências cabíveis.
Paloma reiterou que tomou todas as medidas que cabiam a ela como conselheira plantonista, tanto na noite em que recebeu a comunicação sobre a possível violação de direitos quanto na semana seguinte, quando esteve no local para apurar a situação.
“Uma vez que eu tenho prova documental, que eu tenho certeza de que essa criança, graças a Deus, não está em risco, a minha prioridade hoje, enquanto conselheira, é defender os direitos dessa criança”, assegurou, ao acrescentar que o Conselho Tutelar de Campo Mourão está à disposição da sociedade e que está atuando de maneira séria, íntegra e com o foco principal de defender os direitos das crianças e adolescentes.
Fonte: Tribuna do Interior
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