Está em vigor desde o dia 6 deste mês no Amazonas a Lei nº 6.922/2024, que proíbe eventos musicais e de danças com conteúdo erótico ou sensual nas escolas públicas do Estado. Segundo a professora Dóris Bastos, é “necessário buscar um equilíbrio entre a proteção ao menor e a liberdade de expressão artística”.
A nova legislação, que altera a Lei Ordinária nº 5.039 de 2 de dezembro de 2019, foi sancionada pelo governador Wilson Lima (União) e publicada no Diário Oficial do Estado do Amazonas do dia 6 de junho. Profissionais da Educação alertam que é preciso ter cuidado com esse tipo de norma. A lei foi originada a partir de proposta do deputado Delegado Péricles Rodrigues (PL).
“A princípio, a questão é complexa por diversos motivos. Primeiro, porque os termos erótico ou sensual podem ser considerados subjetivos. Segundo, porque é necessário buscar um equilíbrio entre a proteção ao menor e a liberdade de expressão artística. Terceiro, porque a Constituição Federal de 1988 assegura a livre expressão da liberdade intelectual e científica, o que vale para todos, inclusive para os professores”, diz Dóris Bastos.
A professora alerta para as implicações que algumas leis podem ter sobre a liberdade acadêmica. Ela afirma que alguns parlamentares preferem criar leis proibindo certos manifestações a educar. Essa prática é para “manter o controle sobre culturas e valores”.
“Muito políticos conservadores preferem proibir a educar, por desejarem manter o controle sobre cultura, valores, etc. A questão religiosa também desempenha um papel em moldar suas perspectivas morais. Nesse sentido, a presença de evangélicos nas esferas de poder se contrapõe, também, muitas vezes, à construção de um Estado, de fato, laico. Leis conservadoras sempre limitam o debate no contexto escolar, limitam o pensamento crítico e comprometem a liberdade acadêmica”, afirma Dóris.
O deputado autor do proposta que virou lei argumenta que a nova norma “é fundamental para proteger a integridade e o desenvolvimento saudável desses indivíduos [crianças e adolescentes] e essas práticas podem expor os jovens a conteúdos inadequados para suas faixas etárias, contribuindo para a sexualização precoce, o aumento da vulnerabilidade a abusos e a deturpação dos valores morais.”
Ausência
Ainda conforme a educadora, a criação de leis, projetos de lei e outras iniciativas por um grupo de políticos conservadores no estado, preocupa devido à falta de uma abordagem reflexiva e à ausência de especialistas com respaldo científico para legitimar a regra.
Segundo a professora, essas ações, muitas vezes, não contam com a participação daqueles que têm conhecimento acadêmico aprofundado sobre questões educacionais.
“Esse déficit na participação de especialistas pode ser interpretado como uma afronta à liberdade de cátedra, um princípio fundamental que permite que educadores e pesquisadores expressem suas ideias e promovam debates livres e informados em seus campos de estudo”, afirma.
Dóris Bastos diz que essa falta de base científica na elaboração de políticas públicas pode comprometer significativamente a qualidade da educação. No Amazonas, onde as necessidades educacionais são vastas e complexas, a ausência de um diálogo fundamentado em evidências científicas pode resultar em políticas que não atendam adequadamente às demandas da população estudantil e educacional.
“A Educação deve ser um amplo exercício do conhecimento a fim desenvolver o pensamento crítico e criativo dos alunos. Restrições excessivas limitam a liberdade acadêmica e a exposição a perspectivas imprescindíveis para formar cidadãos informados e capazes de enfrentar desafios do mundo moderno”, ensina a educadora.
Pouco debatido
Lambert Melo, da Asprom Sindical (Sindicato dos Professores e Pedagogos de Manaus), diz que a nova legislação é “compatível” com o que determina o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) sobre a proteção do corpo das meninas e meninos no interior nas escolas.
Para ele, o tema sobre erotização de crianças em ambiente escolar é pouco discutido, mas “de fato existe a erotização de crianças e adolescentes em muitas atividades extraclasse”.
“Muitos professores não se incomodam em usar músicas e danças que expõem o corpo das meninas de forma irresponsável. Infelizmente, nas escolas públicas não há espaço democrático para se fazer debates necessários sobre temas polêmicos. Esses assuntos não são discutidos nas escolas públicas”, afirma.
Conforme Lambert Melo, embora esse tipo de lei seja geralmente proposta por conservadores, “que geralmente são hipócritas”, a entrada dessa legislação específica “pode servir para impulsionar o debate sobre o tema, mesmo que de forma tardia”.
Alterações na lei
A nova lei estabelece definições claras para músicas e danças com conteúdo erótico ou sensual, proibindo-as nas escolas públicas. Além disso, impõe que essas instituições incluam em seus projetos pedagógicos medidas de conscientização, prevenção e combate à erotização infantil.
A responsabilidade pelo cumprimento da lei recai sobre os dirigentes das instituições públicas de ensino, que podem ser responsabilizados em caso de descumprimento, conforme o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado do Amazonas.
A lei também permite que pais, responsáveis ou qualquer entidade jurídica denuncie à Administração Pública ou ao Ministério Público os casos de violação à nova lei.
O que mudou
A Lei 5.039/2019, de autoria da deputada Joana Darc (União Brasil) determinava que as escolas incluíssem em seu projeto pedagógico “medidas de conscientização, prevenção e combate à erotização infantil (sexualização precoce).”
O artigo 2° definia, precariamente, o que a parlamentar entendia por erotização infantil: “Entende-se por ‘erotização infantil’ – ‘sexualização precoce’ a prática de exposição prematura de conteúdos, estímulos e comportamentos a indivíduos que ainda não têm maturidade suficiente para compreensão e elaboração de tais ações.”
A nova lei, proposta pelo deputado Delegado Péricles acrescenta a proibição de músicas e danças eróticas nas escolas. “Fica acrescido o art. 1º-A à Lei Ordinária nº 5.039, de 02 de dezembro de 2019, com a seguinte redação: “Art. 1º-A: Ficam proibidas as apresentações com músicas e danças com conteúdo erótico ou sensual para crianças e adolescentes nas escolas da rede pública de ensino do Estado do Amazonas.”
A nova lei ainda precisa de regulamentação, que deve ser feita pelo Poder Executivo.
Fonte: Amazonas Atual
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